Fogo no circo


“É mais fácil enganar as pessoas do que convencê-las de que foram enganadas.” Marc Twain


Laerte Temple

31.01.2022

Imagem: Reprodução internet

Já ouviu alguém dizer que às vezes é preciso “tocar fogo no circo”? O que isso significa? Conhece o texto “Como fazer um elefante dançar”? Isso é fácil: pegue um elefante jovem, amarre uma corda na pata, a outra ponta num toco e use a teoria do Reflexo Condicionado, de Ivan Pavlov: Recompense (dê comida) quando faz o que você quer e castigue sempre que recusar.

Motivação é o impulso que nos move em direção aos nossos objetivos, bem diferente de mover alguém para atingir objetivos dos outros. A motivação pode ser manipulada? Muitos estudam técnicas para induzir, voluntariamente e com convicção, a pessoa fazer, não o que deseja, mas o que querem que ela faça. De pais a chefes, namorados, governos e bebês, todos manipulam para obter resultados. Sim, bebês! Fome? Fralda suja? Chore e alguém socorrerá. Se não chora, não mama! Moisés, pela fé, fez o povo judeu andar 40 anos no deserto até a terra prometida. Jim Jones, em 1978, pela fé, fez 918 pessoas morrerem envenenadas. Todos manipulam, mas alguns propósitos são escusos.

As técnicas evoluíram e a Internet democratizou todas, desde as mais simples, como “cenoura e pau” (prêmio ou castigo), até as sofisticadas, como fé, patriotismo, lealdade, altruísmo etc. Hoje existe o “influenciador digital”, que escreve mal, pouco pensa e tem milhões de seguidores. Como isso acontece? Ótimas narrativas induzem temor profundo ou grande recompensa. A pessoa mal orientada ou carente de autoafirmação, movida pelo medo ou recompensa, segue o ídolo e faz o que é induzida a fazer. E ainda se sente feliz!

Exemplos desta pandemia: “Vacina salva vidas”. A narrativa científica não foi suficiente, então: “Vacine-se e ganhe ingressos para jogos” (prêmio); ou “Viagens, shows e maconha recreativa, só para vacinados” (medo). Muitos se vacinaram, por convicção, recompensa ou medo. Quanto dinheiro e prestígio perdeu o tenista número um do mundo ao recusar a vacina e não jogar na Austrália? Na democracia existe liberdade de escolha, mas somos escravos delas. Deixar-se influenciar é permitir que outros escolham por você.

Manipular comportamento é imoral ou aético? Depende do propósito. Moisés e Jim Jones que o digam. Dar um carro ao melhor vendedor é um reforço motivacional. O desafio motiva e o reconhecimento gratifica. Dar um carro ao melhor traficante da quadrilha também é reconhecimento. Mas é crime!

Alguns comerciais de TV apelam para a emoção: Ligue “djá” (lembra?); últimas unidades; oferta válida para os primeiros 50 clientes; a promoção expira em 2 horas etc. Campanhas políticas usam a mesma técnica: se fulano for eleito, faltará comida, a corrupção vai aumentar, não haverá emprego.

No mercado, se o preço é justo e o produto agrada, tudo normal. Na política, deveria valer o mesmo, não fosse a manipulação. Criam problemas e se apresentam como única solução. E não há direito à devolução do voto.

Se um é produto ruim, prejudicial à saúde ou ao ambiente, a mídia e as redes sociais denunciam e o consumidor boicota. A venda é proibida e o fabricante é responsabilizado. E se o político for ruim? Quem “produz” políticos? Eles vêm do espaço? Mutação da matéria? Não. São produto das famílias e da sociedade. Se um político ruim é reeleito, talvez a culpa não seja dele.

Voltando ao caso do elefante, ele dança por gostar do prêmio e temer o castigo. Acostumado à corda, não percebe que é mais forte do que ela e pode rompê-la. Se o circo pega fogo, literalmente, o medo o faz arrebentar a corda e fugir. Por isso se diz que às vezes é preciso tocar fogo no circo, para que todos vejam o perigo, saiam da zona de conforto e façam algo para sobreviver.

Já se anunciam problemas graves para criar medo coletivo. Gênios pedirão seu voto para resolver tais problemas. Mas são meros ilusionistas e manipuladores. O verdadeiro gênio previne e evita problemas. Muitos dos que afirmarão saber como resolver os problemas, são os mesmos que ajudaram a criá-los. Porém, será mais fácil enganar novamente o eleitor do que convencê-lo que está sendo enganado. Ao primeiro sinal de fumaça, arrebente a corda e aja. Ou fique na zona de conforto e morra! Confortavelmente!


Revisão ortográfica: Leilaine Nogueira


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