Agricultura de resistência nos campos e nas cidades

por Lala Évan

18.11.2020

Favela Owate de São Paulo
Favela Zona Sul de São Paulo

No descortinar da desigualdade, exclusões sociais, diversidades e superações, nos deparamos com jornadas de mulheres que fazem da grandeza da terra a sobrevivência, do povo das favelas, fazendo brotar uma agricultura de resistência e germinando o agronegócio, pautadas na garra, brindando diariamente suas histórias com um gole de vida.

Para escrever este tema, foi necessário fazer dois recortes; no primeiro acompanhar mulheres de algumas favelas de São Paulo, avaliando o impacto que o plantio trouxe para aquela comunidade, numa alternativa que nasceu como matar a fome como primeira opção.

Encontramos um povo acostumado com a luta e que sorri pelo simples fato de um plantio se transformar em algo para se comer.

Pessoas que realmente passam a crer que no ambiente rural não vai se pensar só em dinheiro, acreditando na missão de ser guardiões das terras, protegendo e indo além, reconstruindo e regenerando.

Em um outro recorte, encontro famílias onde duas mulheres que haviam se distanciado do cenário do agro, seguindo carreiras distintas, retornam às suas origens, comprometendo-se a reforçar a agricultura familiar com cultivo de soja e milho.

Hoje suas histórias buscam unir mulheres com interesses em aprender, somar experiências, aperfeiçoar conhecimentos e ganhar expertise. Não só aperfeiçoar, mas dividir este conhecimento com outras mulheres, despertando a busca pela construção do seu próprio legado.

A pandemia trouxe holofotes ampliando o cenário da fome e da pobreza, num país muito desigual, com uma parcela considerável da população em situação de vulnerabilidade.

E, de repente, olhando ao meu redor, encontra-se um enfoque diferenciado, chamado de agricultura de resistência, que pode ocorrer não só no campo como também em áreas urbanas, como atestam as agriculturas familiares e de subsistência, praticada no seio de muitas famílias.

Essa agricultura de resistência, possui fortes interações de vínculo com a agricultura rural, com os sistemas de abastecimento, desenvolvimento sustentável, segurança alimentar, estratégias de sobrevivência e com o manejo de solos urbanos.


Ocorre, então, a aproximação da agricultura periférica com as cidades, que trabalha com o enfoque no manejo agroecológico, contemplando técnicas de conservação do uso e manejo do solo, além do controle de doenças, elevando ao máximo a utilização do espaço e promovendo um diálogo de saberes com apoio de faculdades.

Esta agricultura, que chamamos de resistência, está mudando a vida dos moradores das periferias - as famosas favelas - onde se observa mulheres em busca de melhorias, em mitigar a fome e criar condições de sustento para as famílias.

Talvez seja a hora do agronegócio ir além e lançar projetos para a agricultura que denominamos aqui, como de resistência, já que não há possibilidade de filiação às cooperativas existentes.

Atualmente cerca de 3,4 milhões de famílias vivem abaixo da linha da miséria, sendo 1,1 milhão residentes em domicílios rurais. Destas, 367 mil produzem para autoconsumo. São famílias que têm mais sorte que as residentes em regiões urbanas onde pouco mais de 108 mil famílias se beneficiam dessa renda invisível, mas fundamental para garantir a segurança alimentar

O propósito deveria ser formar estratégias nacionais, capaz de desenvolver a agricultura de resistência para o pobre, dando novo impulso à economia e aos que estão na luta por superações e continuidade do pequeno agronegócio.

Que estas iniciativas se propaguem e que haja reconhecimento do quanto pode ser feito a partir deste universo que é criativo, tecnológico, sustentável e que mata a fome do mundo.

O campo é da cidade e a cidade é do campo.


Revisão: Maitê Ribeiro
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