Entrevista com a Dra. Ione Aquemi Guibu, sobre a pandemia, por que os idosos são considerados grupo de risco e quem vai receber com prioridade a vacina na pandemia da Covid-19.

por Sonia Okita

01.12.20

Dra Ione Guibu, especialista em Vigilância Epidemiológica da Santa Casa de São Paulo

Dra. Ione Aquemi Guibu é médica pela Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, mestre em Medicina Preventiva, especialista em Saúde Pública e Administração Hospitalar pela USP. Trabalha no Núcleo de Epidemiologia da Santa Casa e é professora nessa faculdade.

Com sua larga experiência e dedicação em Saúde Pública, é reconhecida pelos relevantes trabalhos prestados nos meios acadêmicos e à comunidade.

Nesta entrevista ao CeR, Dra. Ione explica a ocorrência desta e de outras pandemias e quais são os possíveis rumos num futuro próximo.

CeR: Dra. Ione, o que é uma pandemia? Além do que estamos passando a senhora poderia dar outro exemplo do que já ocorreu?

Dra. Ione: Epidemia é o aumento expressivo do número de pessoas com uma determinada doença em um local ou país. Pandemia é o nome dado quando a epidemia se espalha rapidamente por vários países e continentes. Como exemplo, no século XX, ocorreram várias pandemias de influenza (gripe).

Em 1918 houve a pandemia de gripe espanhola, cujo nome científico do vírus é H1N1, que atingiu muitos países; morreram mais de 40 milhões de pessoas, tendo sido considerada a pior pandemia que o mundo enfrentou na história da humanidade.

No Brasil, milhares de pessoas contraíram a doença, inclusive o então presidente Rodrigues Alves, que faleceu em janeiro de 1919.

Dados da Fiocruz indicam que entre outubro e dezembro de 1918, 65% da população adoeceu. Só no Rio de Janeiro foram registrados mais de 14 mil óbitos pela doença e em São Paulo ao menos 2 mil morreram.

Nessa epidemia da gripe espanhola, também houve quarentena, sendo que no momento de maior frequência da gripe, escolas, lojas e outros serviços foram fechados, eventos esportivos cancelados, tudo para diminuir a transmissão da doença.

Em 1957, ocorreu a pandemia de gripe asiática, causada pelo vírus H2N2, cuja mortalidade foi bem menor. Em 1968 e 1969 foi a vez do vírus H3N2.

Em dezembro de 2019 detectou-se uma nova doença, na China, que rapidamente descobriu-se que era causada por um coronavírus que foi denominado de SARS-COV2 e a doença posteriormente classificada como Covid19.

CeR: O que é grupo de risco e por que o idoso faz parte deste grupo?

Dra. Ione: Grupo de risco, na área da saúde, é o termo dado para pessoas que têm algumas características em comum que as tornam sensíveis e mais predispostas a contraírem determinada doença.

Nessa pandemia do novo coronavírus, as autoridades de saúde denominaram como grupo de risco as pessoas com 60 anos ou mais, além daquelas com doenças crônicas como diabetes, hipertensão, câncer, doenças pulmonares crônicas, obesidade e outros.

Isso se deu após as observações e estudos dos médicos chineses e outros profissionais de saúde frente aos primeiros casos ocorridos na China. As pessoas com mais de 60 anos, em sua maioria, possuem alguma doença: hipertensão arterial, ou diabetes, doença renal crônica, doença respiratória crônica etc. Na Covid19, o vírus atinge vários sistemas não apenas o respiratório, e pode atingir o sistema imunológico, o cardiovascular e outros. Assim, se um indivíduo tem hipertensão, seu sistema cardiovascular já está alterado e o vírus pode piorar essa alteração, que pode ser leve ou mais grave. Felizmente, a maioria dos casos de pessoas com Covid19 são assintomáticas ou com sintomas leves, não necessitando de internação.

CeR: Dra. Ione, sob sua visão esta doença veio para ficar? As vacinas irão de fato diminuir a transmissão e deverão entrar no calendário da vacinação junto com as demais?

Dra. Ione: Desde os primeiros casos de Covid19 ocorridos na China até o presente momento, muitos trabalhos científicos foram realizados e já se tem conhecimento de muitas características do vírus, da doença e do seu tratamento.

É necessário que os cientistas continuem a pesquisar para se ter certeza de dezenas de aspectos que não se sabe ainda. Exemplo: quem teve Covid19, está protegido por quanto tempo? Alguns estudos estão apontando que é possível ser infectado novamente.

Dezenas de vacinas contra o Covid19 estão sendo pesquisadas, algumas em fase avançada. O importante é que qualquer vacina consiga proteger as pessoas contra a doença e não cause nenhum malefício. O fabricante, após terminar a pesquisa, tem de solicitar autorização para uma agência reguladora, que no Brasil, é o papel da ANVISA que vai analisar cientificamente, por meio de um comitê de especialistas em estudos dessa natureza, e decidir se aprova ou não a vacina. Se aprovada, será fabricada em grande escala e depois distribuída, conforme critérios estabelecidos pelas autoridades sanitárias.

© Fornecido por NBC News Image: Um técnico de laboratório supervisiona frascos tampados durante os testes de enchimento e embalagem para a produção em grande escala e fornecimento da vacina candidata COVID-19 da Universidade de Oxfords. (Vincenzo Pinto / AFP - arquivo Getty Images)

Em todos os países os profissionais de saúde são os que inicialmente receberão as vacinas aprovadas.

Essa vacina terá de ser distribuída por todo o território nacional de forma adequada para que não perca sua capacidade de imunizar, e ela terá de ser conservada igualmente de forma correta, em geladeira ou freezer, na temperatura indicada para cada uma. Tudo isso leva tempo e, com certeza, a(s) vacina(s) serão aplicadas no Brasil no próximo ano e dificilmente teremos quantidade suficiente para vacinar todo mundo, em 2021. Se a vacina entrará no calendário vacinal, como hoje temos contra a gripe, não sabemos.

Acredito que até meados de 2021, no mínimo, teremos que continuar com as medidas de prevenção ao Covid19: distanciamento, uso de máscaras e higienização das mãos com frequência.

Imagem de Marek Studzinski por Pixabay

São tantos os fatores que influem na transmissão e circulação do vírus que é difícil afirmar com certeza até quando o SARS-COV2 estará circulando no Brasil e nos outros países.


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Revisão: Maitê Ribeiro