O futebol era uma modalidade de esporte proibitiva para mulheres, conforme dispunha o decreto de 14 de abril de 1941 (Decreto-Lei 3199), imposto durante o governo de Getúlio Vargas.
Daniela Alfonsi, antropóloga e diretora de conteúdo do Museu do Futebol, explica que nesse decreto havia o artigo 54 com normas destinadas especificamente para as figuras femininas e que mostrava claramente o posicionamento do Estado sobre o que era ser mulher na época.
“O artigo dizia que as mulheres estavam proibidas de praticar qualquer esporte que fosse contra sua natureza. Não especificava quais esportes, mas o futebol já era bastante popular no Brasil nesse período e ele foi imediatamente tido como um esporte que foi proibido para as mulheres.
Isso se deve ao fato de que ele sempre foi considerado um esporte mais violento, de contato, e todas as justificativas dessa proibição tinham a ver com a preservação do corpo da mulher.
A mulher não poderia participar de atividades físicas impactantes, porque isso poderia causar infertilidade. Era uma visão de que a mulher servia apenas para a maternidade, para gerar filhos para a nação”, enfatiza Alfonsi.
No entanto, isso não fez com que as garotas deixassem de jogar. A antropóloga explica que no interior de estados como São Paulo, Minas Gerais e Rio Grande do Sul, mulheres se reuniam para jogar, até que alguém trazia o artigo da proibição à tona.
Além disso, Alfonsi lembra de histórias pontuais de mulheres que acabaram presas por praticarem o esporte, durante a ditadura militar, e outras que foram acusadas de serem cafetinas, pelo simples fato de que a reunião de um grupo de mulheres era algo visto como comportamento alusivo à prostituição.
É difícil digerir histórias como a de mulheres que foram literalmente presas por jogarem futebol, mas o resultado negativo do Decreto-Lei 3199 representou mais do que isso e, infelizmente, suas consequências históricas se fazem presentes até os dias de hoje.
“A maior punição foi não ter permitido o desenvolvimento do esporte feminino. Ficou claro, por muitas décadas, de que futebol é coisa de homem. Mas a história mostrava que as mulheres já jogavam antes de serem proibidas; tinham ligas, clubes femininos e torneios locais; já tinha um desenvolvimento da modalidade que foi completamente interrompido durante muitas décadas e até agora não retornou como deveria, com todo seu vigor. Avançou muito, mas ainda tem muita deficiência no próprio desenvolvimento”, pontua a antropóloga.
O decreto proibitivo só seria revogado em 1979, período próximo ao fim da ditadura militar. Isso significou mais abertura política e conquista de novos direitos civis, mas não um desenvolvimento imediato do futebol feminino.
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