A celebração da Páscoa e sua origem

Misticismo, Religiosidade e Fé nas tradições da comemoração da Páscoa

Sonia Okita

02.04.2021
Resurrection. (Fr Lawrence Lew/O.P./CC BY-NC-ND)

O rito pagão da primavera na Antiguidade

No mês de março no hemisfério norte, começa a primavera que significa o fim dos dias frios do inverno, e a volta à vida das plantas dormentes, simbolizando uma nova vida para os animais. Nada mais natural que esta estação do ano seja escolhida como símbolo do renascimento desde a Antiguidade por diversos povos. Nesta época do ano a celebração da deusa de nome anglo saxão Eostre ou Ostera, germânico, significava a fertilidade e o renascimento, simbolizados pelo coelho e os ovos. No culto pagão, os nórdicos comemoravam o Eostre no dia 30 de março. Daí derivou o nome Easter, que se traduz como Páscoa na língua inglesa, celebrando o equinócio da primavera. No hemisfério sul ocorre o equinócio de outono, o oposto. O equinócio é um fenômeno astronômico que acontece na primavera e no outono quando o dia dura 12 horas e a noite tem a mesma duração, e para os povos antigos significava a luz e a escuridão em igual duração. A partir do equinócio da primavera os dias vão se alongando até a chegada do verão, maior período de luz e menos escuridão. As observações dos fenômenos naturais eram festejadas com misticismo.

Deusa Eostra da mitologia nórdica

O início da celebração da Páscoa do Cristianismo

Na Bíblia Hebraica, o Pessach, que significa passagem ou travessia, é uma celebração que comemora a libertação do povo judeu da escravidão do Egito, conforme narrado no Livro do Êxodo. É a festa sazonal mais importante para o povo judeu celebrado na primeira lua cheia após o equinócio da primavera, e geralmente ocorre próximo do dia 21 de março.

Nesta narrativa do Velho Testamento, Moisés, aos 80 anos, foi instruído por Deus para libertar o seu povo do Egito. Diante da recusa do Rei Faraó egípcio Ramsés II, as dez pragas do Egito foram enviadas para castigar o povo egípcio, atingindo a agricultura, as pessoas e os animais, com catástrofes sobrenaturais, doenças, e nuvens de insetos, culminando com a morte dos primogênitos. Só depois disso o povo de Israel conseguiu a liberdade e seguiram para a travessia do deserto.

Segundo a crença judaica, a lua nova do mês de Nisan, que corresponde ao período de março/abril, teria sido apontada por Deus a Moisés duas semanas antes do início do êxodo do Egito. Este fato teria acontecido 2448 anos depois da criação do mundo, que é considerado o marco zero do calendário judaico. De acordo com o calendário judaico criado há mais de 3 mil anos, se utiliza da contagem de tempo de acordo com as festividades, o décimo quarto dia de Nisan correspondente ao início da primavera no hemisfério norte.

Esta data coincide com a ressurreição de Cristo e com a celebração pagã da primavera, mas não tem relação histórica alguma entre as passagens. Pode-se supor que houve apropriação desta data, como explicado anteriormente. De acordo com o Novo Testamento a última ceia era um jantar da Páscoa judaica com novo significado, quando Jesus identificou o pão matzá judaico e o vinho como sendo seu corpo e seu sangue. O termo cordeiro de Deus, referindo- se a Jesus Cristo, tem ligação com os cordeiros que, assim como Jesus, foram sacrificados para salvar o povo judaico.

A primeira Páscoa judaica aconteceu na noite anterior à execução da décima praga do Egito, num ritual para evitar a morte dos primogênitos judeus pelo anjo da morte que não passaria pelas casas marcadas com sangue de cordeiro (por isso o Pessach também significa “passar por cima”), que se tornou símbolo do cordeiro pascal, assado e servido com pão ázimo, sem fermento (matzá) e com ervas amargas (maror).

A religião judaica celebra anualmente com uma lembrança perpétua da opressão vivida pelos antepassados e de como se libertaram.

Atualmente a celebração da Páscoa judaica segue um ritual: buscar o chametz, alimentos com grãos fermentados (trigo, cevada, centeio, aveia e trigo sarraceno) que devem ser abolidos da casa; o jejum dos primogênitos na véspera do Pessach em sinal de agradecimento pelas vidas poupadas pelo anjo da morte no passado; acendimento de velas para as orações; a ceia judaica em família, o séder. Durante a ceia a leitura do Hagadá relembra as passagens históricas e mantém as tradições vivas.

A Páscoa judaica em 2021 começa no dia 27 de março e vai até 04 de abril.

Mesa preparada para o Séder na Páscoa Judaica

A bandeja principal da mesa (keará), é composta por: Maror (erva amarga); Charosset (doce, composto de iguarias com a cor de tijolos produzidos no Egito); Carpás (salsão) que lembra o hissopo utilizado para passar o sangue do cordeiro nas portas; betsá, ovo cozido, que representa a opressão que acometeu o povo judeu e seu fortalecimento; zeroá (cordeiro) símbolo de Deus que o tirou o Egito.

Além destes símbolos religiosos, na mesa são colocados 3 pães matzá, que representam os sacerdotes levitas e o povo israelita.

Há também um recipiente com água salgada que lembram as lágrimas derramadas durante a escravidão e o mar que atravessaram.

Uma taça de vinho não fermentado é servida a cada convidado.

A Páscoa Cristã

É a principal comemoração da tradição católica partindo da premissa de que a ressurreição de Cristo dá sentido à fé cristã. A morte e ressuscitação de Cristo significam o sacrifício que salvou a humanidade de seus próprios pecados e dá perspectiva de uma nova vida.

O real significado da Páscoa é a crucificação, morte e o renascimento de Jesus Cristo que ocorreu depois de três dias, de acordo com o Novo Testamento.

A Semana Santa começa no Domingo de Ramos, também chamado Domingo da Paixão, sexto e último domingo da Quaresma, uma semana antes da Páscoa. No Domingo de Ramos ocorreu a entrada triunfal de Jesus em Jerusalém, recebido por uma multidão de pessoas que portavam ramos de palmeira.

Na Quinta-feira Santa Jesus Cristo se reuniu com seus discípulos e celebrou a Última Ceia, e falou tudo o que se sucederia, a traição de Judas e a negação de Pedro. Neste dia se celebra a cerimônia do Lava-pés, em que Jesus lavou os pés dos 12 apóstolos em sinal de humildade, encerrando a Quaresma. A Quaresma é considerada um período de reflexão e comedimento, conforme explica o Frei Sálvio Romero, com jejum de carne às sextas-feiras, pelo sofrimento e sacrifício de Jesus.

Esta data antecede a Sexta-feira Santa ou Sexta-Feira da Paixão, quando Jesus perseguido é morto e crucificado.

Representação do Domingo de Ramos
Representação da Santa Ceia

No Sábado de Aleluia, que antecede o Domingo de Páscoa, acontece a malhação do Judas, que significa a traição de Judas Iscariotes que se vendeu por 30 moedas e entregou Jesus aos algozes soldados romanos. No sábado Jesus permaneceu morto, como qualquer pessoa comum, mas o milagre estava por acontecer no dia seguinte, vencendo a morte.

No Domingo de Páscoa, o renascimento de Cristo celebra sua vida eterna.

A ceia é um símbolo da Páscoa, do pão e do vinho, com significado do corpo e sangue de Cristo. O peixe também é um símbolo que identificava os cristãos entre si como irmãos de fé, para fugir de perseguição.

A Páscoa sucede um período de 50 dias até o Domingo de Pentecostes.


Revisão ortográfica: Bernadete Siqueira

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