Prof Adriano dos Santos
Pesquisador do Laboratório do Movimento Humano
13.09.2021A matéria dessa semana é dedicada às futuras mamães. Para muitos casais, principalmente para aqueles que estão esperando pelo primeiro filho, esse é um momento de incertezas. Para as futuras mães que até então eram sedentárias, será que é o momento de iniciar a prática de exercício físico? E para as que já eram fisicamente ativas, será que vale a pena continuar praticando exercício? Todos esses assuntos serão abordados a partir de agora em uma linguagem simples, mas com teor científico.
Durante a gestação o corpo da mulher passa por diversas mudanças. Dentre elas, o suprimento de carboidrato é alterado para que haja mais disponibilidade de glicose ao feto, isso faz com que a glicemia da gestante seja 15% — 20% reduzida em comparação a uma mulher não gestante. Pensando sobre a glicemia de jejum de uma mulher grávida, agora faz sentido que sintam fome a todo momento, pois com a glicemia diminuída, há uma diminuição na insulina (aquele hormônio que ajuda a retirar o excesso de glicose da corrente sanguínea). Então com a diminuição tanto da glicose como da insulina, o corpo pede por mais demanda alimentar, conduzindo que a gestante se alimente e com isso aumente os níveis de glicose sanguínea e insulina, essa última para captar a glicose e distribuir para todo o corpo, principalmente para o feto que está em constante desenvolvimento.
A alimentação exagerada muitas das vezes resultará em mais ganho de peso durante a gravidez e conforme o Instituto de Obstetria Médica, há um ganho de peso adequado para as gestantes, que está relacionada ao índice de massa corporal (peso corporal/altura2). Como vocês podem observar na imagem extraída da Diretriz de Obstetria Médica abaixo.
O excesso de ganho de peso da mãe pode refletir no excesso de peso da criança ao nascer, bem como o baixo ganho de peso da mãe pode refletir em uma criança com peso abaixo do esperado. Além disso, a taxa de óbito fetal também é maior em mulheres obesas, e a macrossomia fetal (peso do bebê ao nascer anormalmente acima de 4 kg) também é mais comum em mulheres obesas, independente da mãe ser diabética ou não. Então, seguir as recomendações dos órgãos de medicina para mulheres grávidas é de total importância. Além de todos esses fatores na saúde fetal, há o risco para a saúde da mãe, o principal deles é o risco de desenvolvimento de pré-eclâmpsia e diabetes gestacional.
A pré-eclâmpsia pode ser definida pelo desenvolvimento de hipertensão, com proteinúria (níveis anormais de proteína na urina) e/ou edema de mãos, ou face. Ocorre geralmente após a 20.ª semana de gestação, mas pode ocorrer antes também. A pré-eclâmpsia é conhecida como uma doença da primigesta (primeira gestação), mas isso não descarta sua ocorrência em outras gestações. A pressão arterial acima de 140/90 na gestação é indício de pré-eclâmpsia, assim como os níveis de proteinúria acima de 300 mg em urina de 24h.
Acredita-se que a pré-eclâmpsia inicia na placenta com a formação de novos vasos sanguíneos para nutrir o feto. Porém, esses vasos nascem doentes (mais estreitos), dificultando a passagem do sangue, isso faz que o bebe receba pouco aporte sanguíneo e a mulher desenvolva problemas nos vasos sanguíneos que quando se agrava pode levá-la a óbito.
Na diabetes gestacional, o pâncreas que deveria estar produzindo mais insulina para retirar o excesso de glicose do sangue da mulher grávida, parece não estar funcionando direito, fazendo que o sangue tenha mais glicose e com isso desenvolva um quadro de redução na tolerância à glicose. Essa redução na tolerância à glicose é entendida como diabetes gestacional. Após o final da gestação, a diabetes gestacional tende a desaparecer, mas nem sempre isso ocorre.
Em matérias anteriores descobrimos que o exercício pode beneficiar pessoas hipertensas e diabéticas (links das matérias). Os dois principais fatores de riscos para a gestante são a pré-eclâmpsia e o diabetes gestacional, fatores relacionados ao aumento de pressão arterial e glicemia de jejum, respectivamente. Isso nos leva a crer que o exercício pode causar algum benefício para essa população também, diminuindo as chances de desenvolvimento desses dois fatores de risco.
Deve-se ter em mente que as condições de exercício físico para população gestante se diferenciam da população em geral.
De acordo com revisão sistemática publicada em 2012, a prática de exercício físico é benéfica tanto para a mãe quanto para o feto. Além disso, o Colégio Americano de Obstetria e Ginecologia orienta que mulheres grávidas e saudáveis pratiquem exercício durante o período de gestação.
Mulheres fisicamente ativas no período pré-gestacional, tendem a apresentar menos desenvolvimento de pré-eclâmpsia.
Um estudo realizado em animais geneticamente modificados para o desenvolvimento de pré-eclâmpsia durante a gestação, demonstrou que o exercício realizado antes e durante a gestação desses animais, protegem contra o desenvolvimento de pré-eclâmpsia, reduzindo a pressão arterial e os níveis de proteinúria.
De acordo com um estudo de revisão sistemática, a combinação de exercício e dieta previne o desenvolvimento de diabetes gestacional. Além desses benefícios, o exercício durante a gestação reduz a dor lombar e a retenção de líquido.
O principal tipo de exercício recomendado na gestação é o exercício aeróbio por ter uma excelente relação com a proteção cardiovascular e manutenção do ganho de peso em faixas mais equilibradas. E quais seriam esses exercícios aeróbios recomendados? Caminhada, natação, dança, bicicleta ergométrica e qualquer atividade contínua que não coloque em risco a saúde do bebê e da mãe. Vale até passear com o cachorro!
Exercícios que apresentam maior risco de lesão como, esportes de contato, lutas ou que possam causar algum trauma abdominal não são indicados durante a gestação. Vale ressaltar que embora o exercício aeróbio seja o mais indicado, exercício de força como, musculação, pilates e ioga, podem e devem ser utilizados também.
Um benefício do treinamento de força na gestação é justamente a manutenção postural, proteção articular e também contribui para o equilíbrio do ganho de peso, servindo como fator preventivo para os desconfortos musculoesqueléticos.
Além do exercício aeróbio e de força, é recomendado que gestantes pratiquem alongamento, sua prática contribui para que minimize o risco de desenvolvimento de incontinência urinária, que pode ocorrer durante a gestação.
Alguns cuidados devem ser tomados ao realizar exercícios durante a segunda metade da gestação. A prática de exercício na posição supina, nessa fase da gestação, não é recomendada, assim como é preciso evitar Manobra de Valsalva (bloqueio temporário da respiração) durante todas as fases da gestação.
A intensidade de exercício mais segura para essa população, são os exercícios realizados em leve a moderada intensidade. Existem alguns meios fáceis e bem aprovados cientificamente para mensurar a intensidade de exercício. A escala subjetiva de esforço, proposta pelo pesquisador chamado Gunnar Borg é de fácil aplicação e apresenta valores de 6 a 20, esses valores são uma forma de mimetizar os próprios batimentos cardíacos. Nessa escala é possível o próprio praticante apontar o quão cansativo está sendo aquela atividade.
Na frequência de treinamento deve ser levada em conta o grau de condicionamento da praticante, se for uma mulher sedentária, o ideal é que inicie a prática com duração da atividade por 15 minutos e em dias intercalados, e à medida que o condicionamento for melhorando, pode-se optar por aumentar tanto a duração do treino quanto a frequência semanal.
Então, geralmente, o exercício físico reduz os riscos de desenvolvimento de pré-eclâmpsia e diabetes gestacional, além de tornar os nove meses de gestação mais prazeroso. Um outro benefício mostrado no estudo de Angelo Fernando, refere-se à redução dos sintomas depressivos com o exercício durante e após a gravidez.
O papel do profissional de Educação Física em conjunto com toda a equipe de saúde para o bem-estar gestacional é de suma importância. Então, ao praticar exercícios tenha sempre um profissional da área ao lado e extraia dele tudo o que de melhor ele possa oferecer para tornar sua qualidade de vida melhor.
Treinem, exercitem-se, não apenas por vocês, mas por aqueles que estão sendo carregados em seus ventres. Uma mãe com hábitos mais saudáveis, tendem a ter filhos mais saudáveis também.
Referências consultadas
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Revisão ortográfica: Anne Preste