Entrevista com Cláudia Franco, professora de pilotagem de bicicleta

por Sonia Okita

19.01.2021
Cláudia Franco, professora de pilotagem de bicicleta

Essa história de que o cérebro e o físico do idoso não permitem aprender coisas novas é mito. A prova disso é o que Cláudia Franco tem para nos contar contrariando quem pensa que, por causa da idade, não podemos reacender sonhos de infância. “A juventude está na alma e felicidade não tem idade. Você vai conseguir, acredite” são suas palavras de incentivo aos alunos.

Conheça a extraordinária história de vida e os ensinamentos desta professora que vai completar 60 anos, e se dedica em tempo integral a ensinar crianças, jovens e idosos a pedalar uma bicicleta. Para ela o único tempo ruim é quando chove e não pode ir aos parques praticar com seus alunos. Haja fôlego para tanta energia, porque ela também organiza grupos e pratica ciclismo em circuitos de estradas fora dos centros urbanos.

Há dez anos foi quando tudo começou, o número de alunos foi crescendo e Cláudia virou uma empreendedora que se estruturou numa escola, a Ciclofemini. Até hoje conseguiu, junto com seus parceiros colaboradores, ensinar a espantosa quantidade de 12 mil alunos, desde os que nunca pedalaram até os mais experientes que queriam aprimorar a técnica deste esporte. Atualmente, a idade de seus alunos vai dos 3 aos 78 anos.

Cláudia aprendeu a pedalar aos 47 anos, sem professor, a duras penas entre muitos tombos e raladas, mas sem desistir e com muita determinação. Ela conhece como ninguém as dificuldades que um adulto tem para lidar com os bloqueios mentais da infância, da vergonha e do medo de cair e se machucar. Isto lhe serviu como ferramenta para pensar nas pessoas que gostariam de pedalar, mas precisam de ajuda de alguém que literalmente desse um empurrão. Calma e psicologia para isso ela tem de sobra.

Cláudia Franco, professora de pilotagem de bicicleta
Aluna com seu certificado de ciclista
Com alunos nos parques

Na entrevista a seguir, Cláudia conta a trajetória de sucesso de seu ofício incomum, de sua escola de pilotagem e de seus projetos futuros:

CeR: Cláudia, fale-nos um pouco sobre você e porque ser professora de bike. Você se inspirou em alguém ou em alguma situação em que achou importante ajudar outras pessoas?

Cláudia Franco: Quando eu estava para completar 50 anos, eu já havia me decidido a encerrar a minha carreira na área de tecnologia da informação, pois já estava atuando havia 33 anos na mesma área. Tinha como objetivo abraçar alguma atividade voltada para o ser humano, ao seu bem estar, principalmente às mulheres.

Na época já estava envolvida com o esporte, o ciclismo de montanha. A bike me trouxe muitos benefícios relacionados à saúde física e mental. Por conta disto resolvi criar um projeto para inserir as mulheres no mundo da bicicleta, para que elas tivessem a oportunidade de viver experiências e se aproveitar dos mesmos benefícios que eu tive.

O pedalar é libertador, a bicicleta proporciona o empoderamento feminino. A idéia se tornou um projeto, o projeto se tornou uma escola de pilotagem de bicicleta.

“A inspiração veio da minha experiência pessoal com o aprendizado e a prática do esporte ciclismo. Aos 50 anos me tornei atleta amadora e instrutora de pilotagem de bicicleta. “

Atualmente com quase 60 anos, sou campeã de ciclismo de estrada na minha categoria em diversas provas das quais participo, incluindo o 18º lugar no campeonato mundial de ciclismo amador que foi realizado na Polônia no ano passado

Cláudia em sua bicicleta: ciclista amadora aos 59
Com alunos nos parques
O professor Marcelo Ruivo: a idade é só um detalhe

CeR: Como é sua rotina de trabalho?

Cláudia Franco: Meu dia-a-dia é bastante intenso. Acordo às 4 da manhã e começo as aulas às 6. Fico em movimento, fazendo atividade mais de 5 horas por dia. Faço a administração da escola, além de cuidar das mídias sociais. Geralmente as 21h00 já estou na cama. Aos finais de semana pedalo com alunas por estradas, em média 80 a 100 km no sábado e mais 80 a 100km aos domingos. Ministro palestras, presto consultoria para empresas do mercado de bicicletas, faço parte de alguns grupos, comitês e associações de ciclistas, cujo objetivo é cobrar dos governantes melhores políticas públicas para uso das bikes, infra-estrutura, segurança, redução das taxas na venda das bikes e acessórios.

“A Ciclofemini vai completar 10 anos em março de 2021. Ensinamos as pessoas a aprender a pilotar a bicicleta corretamente, com técnica e consequentemente com segurança e com foco em difundir o uso das bikes e seus benefícios”, explica.

Ciclofemini, mulheres que pedalam
Nos parques com alunos

CeR: Você tem algum projeto futuro voltado ao idoso?

Cláudia Franco: Chegando perto dos 60 anos, me deparei como o "idoso" é visto e tratado. Estou bem surpresa com tudo. Todo mundo diz, “nossa você não parece que tem cara de 60”.

“E eu sempre penso: qual é a cara de 60? Cabelo branco, costas curvadas e bengala? Será que não está na hora de mudar este estereótipo?”, pergunta.

Pensando nisto, estou trabalhando em um projeto, ainda embrionário, para questionar a forma como vemos e como lidamos com este "idoso". Está mais do que na hora de repensar as faixas etárias, os rótulos, os tratamentos de saúde e a forma como o idoso é tratado. Quero ser tratada e entendida na minha potencialidade e nos meus desejos. Não aceito o rótulo de "na sua idade esta ótimo assim" como se fosse um prêmio.

Quero ser entendida e tratada de acordo com a minha capacidade física, mental e não dentro da lista genérica do que idosos podem ou não podem fazer. E sei que há milhões de pessoas que compartilham do mesmo sentimento.

Tenho certeza de que, assim como a idéia de inserir as mulheres no mundo da bicicleta se transformou na escola Ciclofemini, o projeto Suddenly 60+ vai se tornar uma ferramenta para um novo olhar sobre pessoas acima de 60 anos.


Veja a seguir o vídeo da entrevista:

Revisão ortográfica: Appio Ribeiro