As várias nuances das cores das campanhas médicas

por Vera Bifulco e Sonia Okita

17.10.2020

Tanto as campanhas previstas pelo calendário oficial do SUS como outras que seguem com um possível apoio, situam-se na esfera da prevenção secundária - que vem a ser um conjunto de ações que visam identificar e corrigir o mais precocemente possível qualquer desvio da normalidade - de forma a colocar o indivíduo de imediato na situação saudável, tendo como objetivo a diminuição da prevalência da doença, visa ao diagnóstico, ao tratamento e à limitação do dano.

Resumindo, a prevenção precoce consiste em um diagnóstico também precoce e tratamento imediato. Fundamentam-se em uma estratégia destinada a prevenir o desenvolvimento de um problema, ainda que assintomático, seja para um único indivíduo ou uma população. Objetiva portanto, o rasteio e, consequentemente, o tratamento precoce de uma doença, reduzindo-se potencialmente a morbi-mortalidade que ela, a doença, poderia vir a causar em um paciente.

Já a prevenção primária é o conjunto de ações que visa evitar a doença na população, removendo os fatores causais, ou seja, objetiva a diminuição da incidência da doença e a promoção de saúde e proteção específica.

Num país tão desigual como o nosso, as campanhas abrangentes para prevenção de doenças são muito importantes mas não exclusivas.

O SUS, apesar das falhas que são apontadas, é um excelente modelo de saúde pública, igual para todos e muito elogiado por especialistas do mundo inteiro.

Porém, desde a atenção primária até os procedimentos de alta complexidade, (como os da área oncológica, exames mais complexos, medicação, fisioterapia, apoio psicológico, cuidadores, materiais e equipamentos específicos etc) existe uma discrepância dentro do próprio sistema. Considere-se ainda que, em São Paulo, a realidade é muito diferente daquela dos estados do Norte, por exemplo.

Detectar o câncer pelos programas de incentivo de um modo geral como faz o Outubro Rosa e o Novembro Azul é importante, mas a continuidade é tão importante quanto. Não só a mortalidade deve diminuir, mas também a qualidade de vida tem que ser vista com mais atenção.

Dito isso, fica claro que o investimento maior em saúde deveria incidir na EDUCAÇÃO EM SAÚDE.

Prevenção é a maior garantia de cura que existe, mas essa prevenção deveria constar de um programa de educação em saúde, que poderia começar nas escolas, nas comunidades de bairros e em tantos outros locais onde a população, principalmente de baixa renda, tem acesso.

Exames não curam.

Vamos a um exemplo: Uma mulher obesa, fumante, sedentária, poderá fazer os exames apregoados nas campanhas como o Outubro Rosa (prevenção e diagnóstico do câncer de mama), ver os resultados negativos, ficar feliz com eles e não alterar em nada seu estilo e vida.

O consultório médico deveria ser, entre outras coisas, um local pedagógico. Cabe ao médico e aos especialistas em saúde repassarem aos seus pacientes, informações e orientações didáticas para além da doença, formando uma consciência do quanto cada um de nós é responsável pela condução do advento de doenças potencialmente evitáveis.

Nosso bem-estar também depende de fatores que não podem ser investigados com exames de laboratório: trabalho, relações pessoais, condições econômicas, estresses, incertezas e tantos outros.

Cada caso é um caso, não podemos generalizar.

Se há, por exemplo, um histórico genético de uma determinada doença na história da família, seja oncológico, cardiológico ou neurológico, cabe ficar atento e procurar orientação que deve sair da boca de um médico. Não sou a favor da medicina demais, do excesso que pode causar mais danos que benefício.

Fazer mais não significa fazer melhor. O uso parcimonioso da tecnologia é sempre o mais aplicável. Lembrar que o cuidado com a saúde deve se somar a história biológica de uma doença mais a história biográfica do paciente, não existindo duas digitais iguais, já que cada indivíduo é uno, ímpar, singular.

Campanhas são alertas, fazem vir à tona uma consciência, mas não devem ditar as normas a serem obedecidas, até porque, como diz o ditado, não “existe almoço grátis”, e alguém está se beneficiando desse comportamento quase imposto pelas campanhas. Se expor a radiações desnecessariamente pode causar danos, mas isso ninguém fala, sem contar com a pressão da indústria para criar a necessidade de terapias e exames.

Somos um país de território vastíssimo e com discrepâncias assustadoras para cada região; são os muitos “Brasis”, como definiu Paulo Freire.

Os exames apregoados nas campanhas ainda não são uma realidade para todas as mulheres brasileiras. Cria-se com isso uma expectativa frustrante para aquelas mulheres que precisam fazer seus exames de rotina, exames estes indicados pelos seus médicos, orientados por eles e que simplesmente nem sequer têm esse acompanhamento.

A Saúde, como acontece em países desenvolvidos, é um bem para todos e gratuita.

O monitoramento à saúde nesses países também é acessível para todos.

Tudo na vida começa com a palavra educação e ela é a base de tudo, já que sem educação o povo segue às cegas, sem crítica, e acreditando no que propagam as mídias.

Sigamos nesta paleta de cores, incentivando muito mais uma "medicina do medo" que uma mudança honesta e consciente de um estilo de vida saudável e acessível a todos.



Revisão: Maitê Ribeiro