O Japão no século do envelhecimento


A sociedade japonesa está na vanguarda da população dos super idosos sem precedentes na história da humanidade. A pirâmide populacional estará invertida nos próximos 30 anos.


Sonia Okita

03.12.2021

Imagem: National Institute of Population and Social Security Research - Nippon.com

A população mundial encontra-se num fluxo de movimento migratório inédito impulsionado pela divisão Norte-Sul, com as populações do Sul em crescimento contínuo enquanto as do Norte estão diminuindo. Refugiados e imigrantes fazem seu caminho do Sul para o Norte em grande número, o que causa uma série de atritos sociais. A procura por melhores condições de vida chega ao extremo da ilegalidade.

Outro fato é a mudança da população da zona rural para urbana, com dramático esvaziamento das áreas rurais, gerando uma população urbana muito maior.

Um terceiro fato observado é a própria estrutura da população, principalmente a proporção entre idosos cada vez maior e a dos jovens diminuindo.

O envelhecimento populacional atraiu a atenção dos países desenvolvidos na década de 1990, e o fenômeno foi marcante no Japão onde a proporção de pessoas com 65 anos ou mais atingiu 26,7% em 2015. A estimativa é que aumente para cerca de 40% por volta de 2026. Em termos mundiais, até 2040 prevê-se que os idosos serão 30%, na Europa, como na Alemanha, Itália e Espanha. Mais tarde serão na Ásia, na Coreia do Sul, Tailândia e Cingapura.

Em todo o mundo o número de pessoas com 65 anos ou mais vai praticamente dobrar até 2050, não sendo exagero descrever o século XXI como o “século da velhice da humanidade”.

Na futura sociedade dos super idosos, quais mudanças vão afetar o Japão nas próximas décadas?

Os super idosos é um conceito que já vem sendo difundido que considera as pessoas com mais de 80 anos sem doenças crônicas e que não usam medicamentos regularmente, e são mentalmente capazes de realizar tarefas com a plenitude dos mais jovens.

Em 2050, no Japão, a população total cairá para menos de 120 milhões e a maioria dos nascidos durante o baby boom pós-guerra terá pelo menos 75 anos. Seguindo as previsões 20% terão 75 anos e 30% pelo menos 65 anos. Dados atualizados do Ministério da Saúde japonês revela que o Japão ultrapassou 86 mil pessoas com 100 anos ou mais. Isto quer dizer que o Japão se tornará uma sociedade super envelhecida sem paralelo na história.

E os custos da previdência social voltada aos idosos aumentará proporcionalmente através de despesas médicas e cuidados de enfermagem, sem contar o número de idosos com deficiência física e mental. No ano fiscal de 2025 espera-se que estes custos possam atingir 20 trilhões de yens, aproximadamente 1,87 bilhões de dólares, dentro de uma estimativa de contar com menos de 1 milhão de profissionais de saúde. Além disso, os idosos com necessidades especiais deve ultrapassar 7 milhões, isto é 1 em cada 5 da população com mais de 65 anos.

Como saída, haverá apelos por aumento de impostos e uma revisão drástica dos benefícios da seguridade social.

Para tentar reverter uma situação sombria no futuro, algumas medidas já estão sendo postas em prática por grupos privados e municipais. Como prova de que estas medidas fazem efeito, o Japão tem a maior expectativa de vida média do mundo há 20 anos, chegou a 83,7 anos em 2015. No mesmo ritmo, a expectativa de vida com saúde também lidera a lista global com 71,1 anos para os homens e 75,5 anos para as mulheres.

Nota: este artigo é do Projeto Questões e Implicações do Envelhecimento da População Asiática, concentrado no estado atual do envelhecimento no Japão em Aging Asian Population Project, by Sasakawa Peace Foundation, Nippon.com

Foto: Flickr

O modelo de envelhecimento do Japão

Os japoneses idosos demonstram um forte desejo de continuar trabalhando, ou sendo ativos com uma alta taxa de participação social, evitando viver isolados, o que demonstra uma visão voltada para o futuro. Isto poderia explicar a vida saudável elevando o nível da longevidade. Para muitos destes idosos, é o momento de devolver o que receberam e realizam trabalhos comunitários mesmo com baixa remuneração que serve de complemento da aposentadoria. Aos 68 anos, Atsuko Kasa diz que não tem absolutamente nenhuma intenção de diminuir seu ritmo. A mulher alegre e enérgica planeja continuar trabalhando perto de sua casa, no Centro Silver Jinzai, na cidade japonesa de Yokohama, pelo tempo que for possível. Ela afirma que é muito jovem para se aposentar e quer ajudar os outros.

Kasa, que trabalhava no departamento de contabilidade de uma empresa de cosméticos, é uma das legiões de japoneses idosos que optaram por abandonar os tradicionais passatempos da aposentadoria como jardinagem, encontros com amigos e cuidados com os netos. Em vez disso, eles voltaram ao mercado de trabalho. São os idosos cuidando dos super idosos.

Em entrevista para Deutsche Welle (DW), Atsuko Kasa declarou que à medida que foi envelhecendo, seu mundo foi diminuindo, e para manter a mente ativa resolveu procurar uma ocupação apesar de não possuir nenhuma habilidade especial. Ela se sente recompensada executando tarefas caseiras com “paixão no coração para pessoas com deficiências, num mundo que nunca conheci antes. Eu gosto muito deste trabalho, pois as pessoas são honestas, claras e gentis” disse.

Para alguns, a renda extra que ganham por meio da organização Silver Jinzai é certamente digna de consideração, mas o dinheiro não é a motivação para a maioria dos 700 mil aposentados registrados na organização nacional criada em Tóquio, em 1975, e as coisas mais importantes são se manter ocupados e retribuir à sociedade.

Está em crescimento uma importante indústria de cuidados médicos e de enfermagem, preocupadas com conforto e assistência aos idosos.

A sociedade japonesa não é receptiva a receber imigrantes, mesmo os descendentes de japoneses nascidos em outros países.

Diferentemente de países onde estrangeiros repõem uma parte da força de trabalho para compensar o grande número de idosos, como Canadá e Austrália, a situação no Japão se agrava por ser historicamente um país com imigração mais restrita. É o que concluiu a pesquisa publicada no Jornal da USP em setembro de 2021 pela pesquisadora da Faculdade de Filosofia da USP Beatriz Miyakoshi Lopes.

Todos os países vão passar por um processo de envelhecimento da população, cada qual com suas peculiaridades. “Boa parte dos países europeus já passou por esse processo até se tornarem populações idosas. A França, por exemplo, levou mais de 100 anos para isso, Suécia, 85, e os Estados Unidos, 69 anos. O Japão foi a primeira grande exceção entre os desenvolvidos, levando só 25 anos.” A tecnologia da robótica, assim como mão de obra de imigrantes, é usada para auxiliar a rotina de cuidadores de idosos para substituir mão de obra braçal em trabalhos que o jovem japonês nativo não quer fazer.

Nos próximos anos, um dos maiores desafios do Japão será o equilíbrio econômico entre a crescente população de idosos com qualidade de vida, a baixa natalidade e a gradativa queda de arrecadação para suprir a seguridade social (Yoshiaki Nohara para Bloomberg Linea, setembro 2021). Questões difíceis não só para o Japão, mas também para o mundo todo.


Revisão ortográfica: Anne Preste

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