Por volta do ano 1200 a.C., diz a Bíblia, o Faraó Ramsés II não permitiu a saída dos escravizados hebreus de suas terras e então, como consequência, foram rogadas 10 pragas para o Egito.
Estas maldições transformaram as águas do Nilo – de fundamental importância para a vida dos egípcios – em sangue e, entre outras intervenções na natureza, houve uma grande seca e uma terrível invasão de insetos.
O vinho – a bebida dos deuses - já era conhecido dos egípcios e, por séculos, marcou sua presença no cotidiano de inúmeras civilizações que desfrutaram dessa bebida reconfortante e calorosa.
Dando um salto de mais de 3000 anos no tempo, chegamos à Europa do século XIX.
O vinho era presença indispensável na vida social dos europeus. Mais ainda, era o responsável por parcela significativa da arrecadação de países como a França, Itália, Portugal e Espanha.
Subitamente, na França, as vinhas começaram a murchar. Em pânico, os viticultores desenterraram as raízes e nada encontraram.
Os vinicultores tentam resolver o problema cada um a sua maneira, até que, finalmente, um biólogo francês descobriu por acaso um enxame de pequenos insetos, parecendo pulgões sugando as raízes da planta.
Indo mais a fundo verificou-se que se tratava de um minúsculo inseto da espécie dos afídeos que se alimentavam da seiva das plantas causando o que se chamaria de Filoxera.
Começou então uma intensa discussão entre os que defendiam que o inseto seria a causa e outros que diziam que seria o efeito. Nesse ínterim a praga se espalhou pela França e ameaçava chegar a outros países da Europa.
Os agricultores tentavam de tudo: sapos ou aves domésticas que comeriam os insetos, óleo de peixe, urina, inundação das videiras e nada resolvia. O desconhecimento do ciclo de vida do inseto, inexistente até então na Europa, fazia com que se usasse sem sucesso produtos químicos e pesticidas.
O governo francês reagiu e estabeleceu um prêmio de 320 mil francos para quem desse uma solução para o grave problema que já estava causando falências e sérias ameaças à economia francesa.
Eis que dois viticultores franceses descobriram que a praga poderia ter vindo dos Estados Unidos através de experimentos feitos com enxertos de videiras provenientes da América.
Estas experiências, feitas anteriormente, não causaram nenhum problema. Hoje acredita-se que as viagens marítimas anteriores à descoberta das máquinas a vapor demoravam longo tempo o que acabava por matar os insetos.
Com os novos navios as viagens ficaram bem mais rápidas e os insetos se hospedavam e sobreviviam imperceptíveis em raízes de plantas e mesmo em outros materiais botânicos, além de máquinas, terra, e até mesmo em pessoas e roupas.
Os dois viticultores franceses acreditavam que a solução estaria nas próprias vinhas americanas que eram resistentes à praga, a qual seria eliminada através de vinhas enxertadas em porta enxertos provenientes de cepas americanas resistentes aos danos da Filoxera.
Nova discussão surgiu entre os químicos e os defensores dos enxertos que acabaram com a vitória desses últimos.
No total foram 15 anos de estagnação da produção de vinhos, notadamente na França e Portugal, atacando mais de 40% das vinhas.
Hoje o mundo do vinho continua a temer a Filoxera que reapareceu na Califórnia (1980) e na Nova Zelândia e parte da Austrália (1990).
A Filoxera ainda é uma ameaça presente na produção de vinhos em todo o mundo com exceção de alguns países e regiões como dizem que é o caso do Chile (por seu isolamento) e áreas com solo vulcânico e arenoso.
O uso de enxertos se propagou e curiosamente a técnica de enxertos daria origem a novos procedimentos que visavam aumentar a produtividade e a produção de melhores vinhos. Com a junção de uvas diferentes criaram-se vinhos diferentes como é o caso, entre outros, do vinho Pinotage, cruzamento das uvas Pinot Noir e Cinsault (também conhecida como Hermitage).
De qualquer forma há um estado de alerta constante para não se contrariar os deuses e ver sua ira transformada em pragas, pois viver sem vinho já ficou algo inconcebível em nossa sociedade.