O eterno Natal

13.12.2019

Há um grande distanciamento temporal entre os acontecimentos da vida terrena de Jesus Cristo e os registros contidos nos livros canônicos. O evangelho de Marcos dista cerca de 70 anos dos fatos ocorridos. Mais distantes ainda são os de Mateus e Lucas (80 a 90 anos) e João (cerca de 100 anos).

Não se sabe ao certo se os evangelistas foram realmente os autores do que conhecemos como Novo Testamento, ou se apenas foram responsáveis por juntar relatos, provavelmente orais, ouvidos de gerações que os antecederam e que conviveram com Jesus Cristo.

No período que vai do reconhecimento do Cristianismo como religião oficial de Roma (325 d.C.) até 367 d.C. quando o Bispo de Alexandria ordenou que fossem destruídos todos os textos considerados heréticos, houve muita perseguição e muitos documentos foram escondidos.

Em 1945, no Egito, na região de Nag Hammadi, encontraram-se vasos soterrados que continham 52 textos, escritos em copta – traduzidos em 1970 – com relatos de testemunhas vivas da época de Cristo, como os chamados evangelhos de Tomé, de Felipe, da Verdade, do Apocalipse de Pedro, etc.

Quando se procura saber em que data nasceu aquele que dividiu o tempo em antes e depois, esbarra-se em alguns problemas, pois os evangelhos canônicos nada falam a respeito e embora os apócrifos nos deem outra visão – não censurada – do nascente cristianismo, ao que se sabe não ajuda muito a respeito da data real do nascimento de Jesus.

Natural, portanto, que se busque na História o verdadeiro ano em que Cristo nasceu.

Considerando que o rei Herodes morreu em 4 a.C., a época prevista para o recenseamento, e os estudos astronômicos de Kepler e registros de eventos feitos pelos chineses no que diz respeito à estrela de Belém, estima-se que o ano correto seria por volta de 6 a.C.

O mês de dezembro também é questionável por não condizer com os relatos canônicos que falam de pastores e ovelhas numa época em que nessa região ocorreria um inverno rigoroso e ambos estariam recolhidos e não nos campos.

Na Roma pagã e mesmo entre os celtas e outros povos, entre 22 e 25 de dezembro comemorava-se no hemisfério norte o solstício de inverno, data festiva em que se rendiam homenagens ao nascimento do Sol invencível e ao deus persa Mitra, considerado deus do Sol e criador da luz, cuja adoração já se estendera por Roma, pela Índia e por outras regiões.

Como essas crenças pagãs ainda estavam muito enraizadas na mentalidade popular, a nascente igreja católica romana resolveu, por volta de 354 d.C., considerar o 25 de Dezembro como a data de nascimento de Cristo, integrando-a aos cultos pagãos, visando amenizar tais crenças, além de contê-las.

Esta data passou a ser considerada como o primeiro Natal, cuja primeira comemoração viria ocorrer em Jerusalém em 440 d.C.

Santo Agostinho (354/430 d.C), testemunha desses tempos iniciais do cristianismo, faria um alerta: “Não celebrem o Sol mas celebrem aquele que criou o Sol”.

Com exceção das igrejas do Oriente que guardam o 6 de Janeiro, dia da Epifania (aparição ou manifestação, normalmente relacionado à visita dos reis magos ao Menino Jesus), o 25 de Dezembro se universalizou como a data do nascimento de Cristo, festividade comemorada com comidas, bebidas e troca de presentes, da mesma forma que era costume entre os pagãos.

Numa época em que eram poucos os alfabetizados (a primeira bíblia impressa data de 1455), São Francisco de Assis, preocupado em levar à população menos privilegiada uma imagem que falasse mais do que palavras, criou numa gruta da cidade italiana de Greccio, em 1223, o primeiro presépio, representação do nascimento de Cristo conforme relatado por Lucas. Essa representação se tornaria mais um símbolo natalino que se espalharia pela Itália e por todo o mundo.

Paulatinamente as comemorações natalinas se adaptariam aos costumes de cada povo e região.

Na língua inglesa, o termo natal, originário do latim natalis (nascimento), foi substituído pela palavra “christmas”, ou seja, missa de Cristo.

Em muitos países, na noite de 24 de dezembro, as famílias iam à missa, quando muitos cânticos natalinos se popularizaram e, retornando às suas casas, faziam uma pequena ceia e, no dia seguinte, as crianças recebiam singelos presentes.

Nos países de língua portuguesa e espanhola havia a tradição da missa do galo, celebrada à meia-noite do dia 24 de dezembro, referência à ave responsável pelo anúncio do despertar de um novo dia, de uma nova era.

Aproxima-se mais um 25 de Dezembro quando, mais uma vez, as famílias se reunirão em torno de uma mesa e presentes serão trocados. Até que um dia, qualquer que seja este dia, se dará graças ao alimento que nos nutre e palavras e atos serão ofertados a nossos irmãos em homenagem àquele que nos deu a Verdade e nos mostrou o Caminho.