Conversa com Mulheres apresenta Michelli Bordinhon


O resgate da alma e da dignidade de uma criança não tem preço.


Cleo Brito

27.08.2021

Psicóloga, educadora e fundadora do projeto Bunekas, com sede na cidade de Jundiaí - estado de São Paulo, que abriga um ateliê para a confecção de bonecas. Uma ação totalmente voluntária que hoje agrega 35 grupos de bunekeiras em todo o Brasil, responsáveis pela distribuição de mais de 60 mil itens no continente africano. Um projeto que ensina as crianças sobre a autoproteção e autocuidado através das bonecas de projeção, confeccionadas sem expressão de alegria ou de tristeza para a criança projetar no brinquedo seu próprio sentimento, e se sentir linda. Além de exalar cheiro de bergamota, que possui efeito antidepressivo e repelente, é pensado para a que criança carregue uma memória olfativa e recordar sempre desses encontros.

O projeto Bunekas foi idealizado por Michelli a partir de um convite, em 2017 pela ASN Brasil, para participar de uma missão social na África, da qual ela não teve a possibilidade de se juntar à equipe, porém, se manteve atenta as informações sobre a dura realidade das crianças africanas. Diante deste contexto, procurou uma maneira de prestar a sua solidariedade. Tendo participado de um laboratório de pesquisa sobre brincar, na USP, visualizou que através de bonecas seria uma maneira de resgatar a autoestima das mulheres negras da África, principalmente das crianças, que vivem num lugar onde não há saneamento básico, energia elétrica, emprego, e ainda são fortemente hostilizadas por um padrão de beleza exigido pelo mundo, ao ponto de levar algumas dessas meninas a utilizar ácido para o branqueamento da pele e cabelos colados no couro cabeludo, provocando lesões na cabeça.

Para a construção da Buneka, Michelli pensou em tudo para fazer sentido àquela criança de outro continente diferente da sua realidade. Após muitas pesquisas com profissionais locais, voluntários, missionários e educadores, o projeto foi concluído e o retorno foi muito significativo, pois as crianças africanas conseguem ter seu primeiro contato com uma boneca. Suas bonecas eram feitas com garrafas pets ou pata de vaca seca, que eram cobertas com um tecido e cabelo de milho.

Quando distribuídas, as Bunekas são expostas em uma mesa e as meninas em fila escolhem a sua, apesar da exigência no padrão de produção das bonecas, elas são diferentes, pois, imprime a energia de cada voluntária, não se sabe se as bonecas as escolhem ou elas escolhem as bonecas, observando a valorização na receptividade das meninas.

Elas conseguem se identificar nas bonecas e projetam seus sentimentos no brinquedo. A boneca utiliza calcinha porque é uma maneira educacional que o projeto identificou para abordar o abuso infantil e questões de higiene, facilitando ao educador entender o que a criança está passando naquele momento. Com as bunekas, as meninas recebem um kit a com um vestido, uma calcinha, um enfeite de cabelo e um fôlder sobre orientações básicas.

Não só as meninas são presenteadas, os meninos também recebem bolas, shorts e todo o material de orientação preventivo à criança. O foco principal são as bonecas negras, mas também tem um olhar à diversidade, inserindo as bonecas albinas, sendo em menor escala. O projeto tem a finalidade de resgatar o ato de brincar. Muitas destas crianças precisam ajudar os pais em casa e muitas vezes têm que cuidar e suprir a carência emocional dos seus vários irmãos. Por assumirem diversas responsabilidades, a maioria não tem tempo de ser criança.

Durante as viagens e atendendo milhares de crianças que passaram por abuso, foram registrados muitos momentos marcantes, evidenciados nas denúncias pelas crianças, através das bonecas, como se fosse uma brincadeira. Elas conseguem projetar o abuso que sofreram utilizando o brinquedo. Um relato de Michelli, quando em visita a um ambiente de refugiados de guerra, se deparou com uma menina de seis anos, abusada pelo padrasto, que chegou com a mãe ¬ a minha filha foi destruída e eu a trouxe para você consertar; onde destruída quer dizer abusada e consertar significa curar. Quando a menina recebeu a buneka disse - Tia eu não sou a boneca, porque ela é linda e eu sou suja. Neste momento, Michelli, sentiu a nulidade de seus diplomas, se sentiu impotente e foi brincar com ela, brincou por dias com esta menina. Quando enfim era hora de partir, queria se despedir daquela menina. Ela veio correndo ao encontro dela, vestida como a buneka - Tia, agora eu sou a boneca. A mãe, que também recebeu orientações, entendeu a situação e mandou o padrasto embora de casa. O resgate da alma e da dignidade de uma criança não tem preço.

Em quatro anos já foram realizadas visitas em 14 países no continente africano e no Haiti A chegada nos países era sempre uma grande festa e voluntárias estrangeiras aproveitavam para serem capacitadas. Com a chegada da pandemia e as fronteiras do continente africano fechadas, Michelli Bordinhon contou com ajuda de Ongs e voluntários para realizar a entrega de kits para todo o Brasil. A logística de entrega das Bunekas é realizada em parceria com Ongs que tenham compromisso com o bem-estar da criança. O trabalho social de Michelli sempre foi muito intuitivo e quando se aplica a empatia facilita, assim, deixa uma mensagem: - acredite na voz do seu coração, tudo e possível quando se conhece uma realidade e quer mudá-la.

O Projeto Bunekas está de portas abertas para novos voluntários que queiram apoiar o projeto, seja com doações de materiais ou com mão de obra.


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Revisão ortográfica: Anne Preste


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