Histórias dos 70 anos da TV no Brasil

por João Aranha

28.09.2020

O Brasil foi o quarto país do mundo a ter televisão e o primeiro da América Latina

Corriam os anos 1950. Assis Chateaubriand (1892/1968) o intrépido criador da cadeia jornalística Diários Associados, em viagem aos Estados Unidos, se encanta com a recente invenção da televisão.

“O mais subversivo instrumento de comunicação deste século”, teria profetizado ele. Mesmo envolvido na criação do Museu de Arte de São Paulo e nas conturbadas eleições presidenciais, Chatô, como era chamado, toma uma das suas famosas decisões bombásticas: arrecada 500 mil dólares, paga a primeira prestação do total de 5 milhões para a RCA Victor e logo 30 toneladas de equipamentos estão sendo enviadas para São Paulo.

O Brasil passa a ser o quarto país do mundo a ter televisão e o segundo a ter uma estação particular. As duas estatais seriam a francesa e a inglesa e a outra particular a NBC americana.

Em 18 de setembro de 1950, inaugura-se em São Paulo, a PRF-3 TV Tupi - Canal 3.

Chatô usa toda a equipe de artistas e técnicos da Rádio Difusora, instalada no bairro de Sumaré, em São Paulo. Preocupado com questões trabalhistas manda acrescentar nos contratos de trabalho do pessoal a expressão “Rádio e TV”.

A torre retransmissora já havia sido instalada no alto do edifício Banespa, no centro da cidade.

Uma grande e solene festa é montada nos salões do Jóquei Clube, onde inúmeros convidados aguardam a imagem que será transmitida dos estúdios da Sumaré. Eis que surge um imprevisto e uma das três câmeras não funciona e o americano que supervisiona a transmissão informa assustado que a solenidade teria de ser cancelada, pois seria impossível enviar imagens com apenas duas câmeras.

Os técnicos especulam o que teria acontecido com a câmera defeituosa. Uns dizem que o Dr. Assis quebrou uma garrafa de champagne ao inaugurá-la (o que não é verdade) e outros dizem que foi a água benta aspergida pelo arcebispo ou pelo frei Mojica, padre cantor da época.

De qualquer maneira, o jeitinho brasileiro prevaleceu e com duas câmeras a imagem foi transmitida.

O show teve a participação da rumbeira cubana Rayito del Sol, acompanhada pela orquestra de George Henry e a “canção da TV” escrita pelo poeta Guilherme de Almeida, que deveria ser cantada por Hebe Camargo, mas foi substituída às pressas por Lolita Rodrigues e Vilma Bentivegna. Dizem que Hebe estava rouca. Será?

Nos salões do Jóquei, Chatô, não cabendo em si de contentamento, anuncia mais uma de suas bravatas: resolve fazer um leilão dos principais pratos que serão servidos e além de arrecadar fundos, manda enviar toda a comilança para os técnicos que estão no Sumaré. Ainda espantado com a criatividade brasileira, o técnico americano faz a pergunta que não quer calar: “Quantos aparelhos de TV estariam sintonizados naquele momento?”. Depois de um longo silêncio vem o inacreditável: “Nenhum”.

Esqueceram-se do principal, mas logo Chatô manda importar 200 aparelhos Invictus e a menina prodígio Sonia Maria Dorce(*) pôde então dizer as palavras inaugurais da TV Tupi Canal 3, cujo símbolo, um curumim, homenageia os índios brasileiros.

Em 1951, a televisão chega ao Rio de Janeiro, não antes de acontecer mais uma das histórias do Chatô.

Procurava-se o melhor ponto para se instalar na então capital, a antena que seria a retransmissora das imagens. Muitos morros do Rio já estavam sendo habitados e, como diziam, tinham donos. Os técnicos sugerem que o melhor seria o morro Sumaré, no alto da floresta da Tijuca, mas ninguém consegue descobrir quem é o dono. Chatô então ordena que um caminhão traga uma enorme carga de pneus velhos e manda tocar fogo neles. A fumaça, vista de todos os cantos do Rio de Janeiro, chama atenção do dono que logo aparece e um acordo é feito e a antena instalada.

Esta é apenas uma das inúmeras histórias da TV e do seu criador, o intrépido paraibano Assis Chateaubriand, que seria futuramente chamado de “O rei do Brasil”.

(*) Sonia Maria Dorce, no auge de sua popularidade, foi minha colega no Colégio Rio Branco, assim como Tarcísio Meira (um dos primeiros galãs), Carlos Alberto de Nóbrega (filho de Manoel da Nóbrega - criador da Praça da Alegria que ainda está no ar comandada pelo Carlos Alberto) e John Herbert (que fazia com Eva Wilma, sua futura mulher, o programa “Alô Doçura”) que, embora não fosse aluno, sempre esperava suas fãs na saída da escola.

Revisão: Maitê Ribeiro