Caminhando pela vida

por Malu de Alencar

14.08.2019

Nunca pensei na velhice, na minha velhice, achava que era uma etapa da vida que não me pertencia, mas era evidente em meus pais, tios, pais de amigas e amigos e alguns conhecidos.

Velhice nunca foi uma preocupação vital, a idade aumentava a cada aniversário mas não me pesava.

Gostava de aumentar minha idade em dez, quinze, vinte anos... uma diversão boba, dai quando se interessavam pelo assunto eu inventava histórias:

- "Não acredito, você está inventando"

E eu dizia:

- "Minha juventude se deve ao creme que uso, uma mistura de sementes, ervas, tudo natural...." e logo aparecia uma receita mágica... No final desmentia.

Nunca pensei em aposentadoria, gostava de trabalhar, gostava de novos projetos e tinha certeza que a vida sempre me seria pródiga, que era protegida por anjos, pelos antepassados, pela certeza que nada de mal me aconteceria.

Sempre tive um carinho especial pelas pessoas idosas, gostava e gosto de ouvir suas histórias, a trajetória de vida de cada um, os amores, as decepções, as alegrias, as tristezas.

Em 1992, tive a honra de implantar o Museu de Campos do Jordão; propus a gravação de depoimentos de antigos moradores que tinham participado da construção e desenvolvimento da estância de cura e turismo do estado de São Paulo.

Conheci figuras incríveis, uma delas foi especial, o velho amigo João Aguiar, um carioca que truncou sua vida por causa da tuberculose que o agarrou nos idos de 1930, no início de sua vida profissional.

Curado voltou para sua cidade natal, mas rejeitado pela família e sociedade, retornou para a montanha de onde não deveria ter saído, conseguiu emprego como recepcionista do Hotel Toriba, profissão que se orgulhava apesar de ter se preparado para uma carreira em empresa multinacional.

Por muito tempo acompanhava João Aguiar na sua caminhada pela longa avenida que corta a cidade ao lado dos trilhos da EFCJ.

Contava detalhes de cada esquina, da plantação dos plátanos que marcam religiosamente as estações do outono, inverno e primavera. Da luta dos partidários da Coluna Prestes, do padre que espantou a todos graças a bendita chegada do "ruço" que baixou e espantou a todos numa correria atropelada!

Histórias que me faziam rir e outras chorar, todas ainda muito vivas em minha memória.

João Aguiar partiu, mas deixou um legado enorme sobre a história de Campos do Jordão, todas registradas em depoimento em video, outras em escritos que me mandava de vez em quando.

O que me encanta nas pessoas que conseguiram vencer décadas, é o humor, as histórias e causos, além da experiência adquirida.

E pensar que na cronologia uma década não é nada, mas cinco, seis, sete, oito.... pesam, mas pesam no corpo, não na alma.

Temos que diferenciar o que é velhice, rabugice de longevidade, do saber viver.

Nada a ver com auto-ajuda!

Fico preocupada com tantas regras para se viver bem, mas o que não contam é que a simplicidade, a cordialidade, a amizade, o carinho, o respeito, o sonhar, uma boa conversa, umas risadas, o encontro para o preparo de uma comida gostosa, não tem preço.

Faz a vida mais leve.

Assim caminho pela vida!