Em estudo publicado em 2020, pesquisadores identificaram que 78% das candidatas entrevistadas foram vítimas de ao menos um tipo de violência política. Foto: Lela Beltrão
Uma carta de 12 páginas foi enviada ao Governo Federal em 29 de outubro de 2021 por relatores da ONU. Nela, eles expressam preocupação com o aumento da violência política contra mulheres negras no Brasil, principalmente mulheres transgêneros. A informação é da coluna Jamil Chade.
O documento foi assinado por Tendayi Achiume, Irene Khan, Victor Madrigal-Borloz, Reem Alsalem, Dominique Day, relatores da instituição, e pela presidência do Grupo de Trabalho da ONU sobre Discriminação contra Mulheres.
De acordo com informações que constam no documento, a preocupação se dá principalmente pela aproximação de mais um ano eleitoral. Em 2020, as eleições foram marcadas por casos de violências política e eleitoral.
"Esta forma de violência política contra as mulheres afro-brasileiras e particularmente as mulheres afro-brasileiras transgênero revela o racismo estrutural e institucional difundido na sociedade civil brasileira, bem como as formas persistentes de discriminação intersetorial contra as mulheres e a discriminação baseada na orientação sexual e identidade de gênero que continuam a impedir sua participação e representação política igualitária nos processos de tomada de decisão", denunciam os relatores.
O estudo “Violência Política Contra Mulheres Negras”, realizado pelo Instituto Marielle Franco, em parceria com as organizações Justiça Global e Terra de Direitos, identificou que 78% das entrevistadas foram vítimas de ao menos um tipo de violência política. Boa parte delas foi por meio virtual.
"Oito em cada dez candidatas negras receberam comentários machistas, misóginos e racistas em suas redes, foram atacadas em lives ou tiveram suas reuniões virtuais invadidas – o que configura violência virtual. Seis em cada dez dessas mulheres (62%) sofreram violência moral e psicológica, tendo sido ofendidas, insultadas e humilhadas publicamente devido à religião, ao lugar de origem ou ao simples fato de estarem na política", diz o estudo.
As mulheres negras representam 27,8% da população brasileira, mas têm baixa representatividade política. Foto: Geraldo Magela/ Agência Senado
O documento aborda também a falha nos mecanismos de denúncia existentes no país. Segundo os relatores, a ineficácia desses dispositivos em casos de racismo, sexismo e transfobia "poderia constituir uma violação dos direitos dessas mulheres sob as leis internacionais de direitos humanos".
Um outro ponto de destaque da carta é a participação ativa de autoridades públicas na perpetuação de discursos de ódio. Para eles, o direito de participação política, princípio que faz parte da Declaração dos Direitos Humanos e que o Brasil é signatário, deve ser assegurado pela União para todos, sem discriminação.
"Na medida em que ameaças, discurso de ódio e medidas de proteção inadequadas impedem as mulheres afro-brasileiras, particularmente as mulheres afro-brasileiras transgêneros, de exercer plenamente seus direitos de participação política, expressão política e acesso à vida pública, há uma obrigação permanente do Estado de impedir tais violações tanto por parte de atores públicos quanto privados e de proporcionar reparação às partes afetadas", recomenda o órgão.
Revisão ortográfica: Leilaine Nogueira