Caso Moïse: CDH realiza audiência pública para debater racismo e xenofobia

Familiares da vítima denunciam edição de vídeo que registrou as agressões


Redação

11.02.2022

O senador Humberto Costa (PT-PE) deu destaque ao desmonte de mecanismos de combate a essas violências por parte do Governo Federal. Foto: Reprodução/ Youtube/ Agência Senado

Na última terça-feira (08), a Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) do Senado Federal promoveu uma audiência pública para debater a violência contra migrantes e refugiados. O pedido para a realização do debate foi apresentado pelos senadores Humberto Costa (PT-PE), presidente da Comissão de Direitos Humanos, e Paulo Paim (PT-RS), presidente da Comissão Mista Permanente sobre Migrações e Refugiados.

A 2° reunião extraordinária foi requerida após a repercussão da morte de Moïse Kabagambe, congolês assassinado a pauladas após cobrar o pagamento de R$ 200, fruto de dois dias de trabalho. O caso ocorreu em quiosque localizado na orla da Barra da Tijuca, bairro nobre da zona oeste do Rio de Janeiro.

O senador Humberto Costa destacou o histórico de acolhimento do Brasil com imigrantes de diversas nações, que vêm para o país em busca de melhores condições de vida, mas que nos últimos anos, vem sendo palco de atos de violência recorrentes, sobretudo contra pessoas negras. Ele deu destaque ao desmonte de mecanismos de combate a essas violências por parte do Governo Federal.

Os senadores Humberto Costa (PT-PE), presidente da Comissão de Direitos Humanos, e Paulo Paim (PT-RS), presidente da Comissão Mista Permanente sobre Migrações e Refugiados, em reunião na Comissão de Direitos Humanos. Foto: Roque de Sá/Agência Senado

“[Os imigrantes] se deparam com uma sociedade marcada pelo racismo, pela xenofobia e pela intolerância religiosa e cultural. Principalmente no contexto político em que outrora vivemos, no qual o próprio presidente da nação comete atos criminosos e desumanos”, disse o senador pernambucano.

Em reunião extraordinária na última segunda-feira (07), a CDH aprovou a realização de uma diligência por parte da comissão no Rio de Janeiro junto a Polícia Civil e ao Ministério Público estadua, na próxima semana, para cobrar ações e punições aos responsáveis pelo assassinato de Moïse.

Lucas Santos Fernandes, coordenador regional - no Rio Grande do Sul - da Coordenadoria Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo e Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas (Conaete) do Ministério Público do Trabalho, informou que o órgão apresentará uma resposta rápida à sociedade.

“A sociedade clama por justiça e isso não se limita à prisão dos assassinos. Eu entendo que nós não devemos analisar o racismo pelo prisma individualista, achar um culpado. Não são casos isolados. É uma luta por direitos”, destacou o procurador do Trabalho.

O presidente da Comissão Arns, José Carlos Dias, lembrou que dois policiais civis foram avisados da agressão e ignoraram o chamado e que as autoridades só atuaram depois de manifestação pública da família e forte mobilização da sociedade. José Carlos afirmou que a omissão do estado e o silêncio daqueles que detêm o poder “é tão criminoso quanto o ato que foi praticado”.

“O Brasil é um país violento e extremamente racista. Não é lugar seguro para refugiados. Principalmente, sendo refugiados negros. O negro é visto como ameaçador e, portanto, descartável. Fazemos de conta que vivemos em uma democracia racial. Moïse, congolês, refugiado desde seus 13 anos, foi assassinado barbaramente por ser negro. Por não ter seus direitos trabalhistas respeitados, por viver num país xenófobo e racista”, disse ele.

O irmão de Moïse, Djodjo Kabagambe, e o tio da vítima, Yannick Kamanda, também participaram da audiência pública e cobraram ação das autoridades. Yannick agradeceu tudo o que está sendo feito, mas diz que “o principal, a justiça, não está sendo feita”. Ele diz que além de nem todos os envolvidos estarem sendo investigados, o vídeo que mostra todo o ocorrido foi editado.

Djodjo Kabagambe e Yannick Kamanda, respectivamente, irmão e tio de Moïse. Eles cobraram ações mais efetivas das autoridades e denunciaram a edição do vídeo que registrou as agressões. Foto: Reprodução/ Youtube/ Agência Senado.

“A gente agradece muito tudo o que está sendo feito. Mas o principal, que é a justiça, não está sendo feito. Eu assisti o vídeo completo na delegacia junto com o delegado, mas eu queria saber o porquê do delegado ter pedido para deixar isso no sigilo. Um ato de tanta barbaridade, tão cruel. Depois que ficou em sigilo, editaram o vídeo e nem nosso advogado tem acesso”, diz Yannick. “Há sim participação de outras pessoas, quanto em qualidade de omissão de socorro e agressões, mas esse vídeo não está parecendo. Sem a prisão de todos os envolvidos, minha família não se sentirá segura", completa o tio de Moïse.

Até agora, três homens foram presos e estão sendo investigados pelo assassinato de Moïse.

O senador Humberto Costa qualificou a denúncia como grave e disse que espera que a diligência das Comissões da Câmara e do Senado ao Rio de Janeiro possa trazer respostas para a família de Moïse, para o Senado e para a população brasileira.


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