Racismo estrutural e linguagem

por Sérgio Cahen (pesquisa) e João Aranha (texto)

08.09.2020

O jantar. O artista francês Jean-Baptiste Debret (1768-1848) passou 15 anos no Brasil retratando o cotidiano de uma sociedade construída sobre a escravidão

Por trás das palavras que usamos no nosso cotidiano pode haver, sem que percebamos, um racismo sutil, empregado para segregar pessoas.

Ao transmitir através da linguagem nossas ideias, valores e sentimentos, temos por costume recorrer a alguns estereótipos raciais, criando uma relação preconceituosa entre negritude e negatividade.

O uso constante desse falar, desse hábito embutido nos costumes, acaba reforçando nosso inconsciente coletivo.

Somos fruto de um regime escravocrata que durou mais de 300 anos, colonizados por uma sociedade, como tantas outras, estruturada de forma a excluir as minorias.

Nossas expressões, portanto, ainda trazem o ranço dessa desigualdade e desse racismo estrutural.

Sem ter que recorrer aos exageros do “politicamente correto”, cabe-nos atentar para o real significado das palavras que pronunciamos, evitando transferir a responsabilidade para aqueles que interpretam os nossos dizeres.

Foi com o intuito de chamar nossa atenção para esses termos que podem soar ofensivos, que a Secretaria de Justiça e Cidadania do Distrito Federal publicou uma espécie de manual, listando as expressões utilizadas costumeiramente.

Além de elencá-las, a Instituição ainda sugere sinônimos que vão além das implicações raciais, sem que haja alterações no significado das palavras.

Veja abaixo alguns exemplos:

Criado-mudo:

Era o escravizado que ficava em pé, ao lado da cama a noite inteira em silêncio, normalmente segurando água e objetos para servir os “senhores”.

Substituição: mesa de cabeceira.

Meia-tigela:

A expressão vem da época da escravidão. Quando os escravos faziam o serviço ao agrado do dono recebiam uma tigela cheia de comida e aqueles que não faziam recebiam a tigela pela metade, significando que o trabalho estava malfeito.

Substituição: malfeito, medíocre.

Doméstica:

O termo possui origem nas mulheres negras que trabalhavam dentro da casa das famílias brancas e eram consideradas domesticadas. Isso porque os negros eram vistos como animais e por isso precisavam ser domados.

Substituição: trabalhadora, empregada em trabalhos caseiros.

Clique aqui para conhecer outros exemplos.


Revisão: Maitê Ribeiro