Entrevista: Pe. Júlio Lancellotti

“Furar a bolha, significa construir um juízo de valor vestido de humanidade”

por Lala Évan

14.10.2020

“Minha senha de rua é o olhar” Imagem: jornalistaslivres.org

Neste último sábado, 03/10, no Café com Pauta do grupo Oboré, Aldo Quiroga, foi responsável por mediar a entrevista com o Padre Júlio Lancelotti, quando ouvimos como ele interpreta a importância dos significados das regenerações humanitárias.

Padre Júlio, que é vigário episcopal para a população de rua da Arquidiocese de São Paulo, destaca que tudo o que faz é em nome da Igreja Católica; conseguindo, assim, furar a bolha e trazer as informações com valores civilizatórios, onde existem pessoas invisibilizadas.

Em sua fala de 30 minutos, não há como deixar de estabelecer um paralelo com a primeira teoria científica a abraçar o conceito de universos paralelos, ou realidade alternativa, que é uma realidade auto contida em separado coexistindo com a nossa própria.

Essa realidade em separado pode variar em tamanho, de uma pequena região geográfica até um novo e completo universo, ou vários universos formando um multiverso.

Olhando este conceito, não lhe parece familiar? Reflete a humanização das relações, abordando temas como comportamentos, relacionamentos, mudanças e diferenciais humanizados, apresentando o ser humano como chave central porém com comportamentos ambíguos.

Ao longo de sua entrevista Padre Júlio provoca reflexões sobre o papel da sociedade, mostrando uma grande disponibilidade para com a população de rua em ouvir, dar vazão a anseios e ajudar a construir respostas para a situação em que se encontram, independentemente de quem seja. O Padre diz que o problema é que “usamos o nosso modelo de comportamento de vida para julgar o outro”.

Com esse argumento, justifica o porquê que muitos moradores de rua não gostarem de irem para abrigos, fazendo um comparativo de quando ele fez o seminário, onde mesmo entre jovens havia o chulé, polução noturna dependendo do que comeu, etc.

“Minoria aqui é minoria Descarte não é exclusão Não existe política de encarte Perdoar não é esquecer”

Quando observado o morador de rua, além de todos esses históricos da sua própria jornada vivenciada, o morador de rua ainda tem de conviver com um sono vigiado, negando sua sexualidade, em que Lancellotti classifica como um verdadeiro campo de concentração. Mencionou, ainda, que eles precisam de moradia permanente: “A população de rua tem território, estabelece relações, significados e a cidade é para todos e para os pobres também".

Quando questionado sobre o que os jornalistas poderiam fazer para ajudar nessa causa, respondeu que nós temos de conviver com eles, para entender o que pensam, o que sentem, para serem reconhecidos pelos próprios moradores de rua. “Lá você vai encontrar de tudo, os contestadores, os que gostam de ler, de escrever”.

O Padre finalizou com a certeza de que sempre ele estará lutando pela minoria, não só dos moradores de rua, pois considera qualquer causa social importantíssima, assim como são a dos negros, pobres, mulheres, LGBT’s e tantas outras, que vem ao encontro da fala do Papa, um dos poucos estadistas que sobrou.

VaticanNews (fotospublicas)

Por falar no Papa, ele ligou para o padre Júlio Lancellotti, na tarde do sábado (10). O pontífice abordou a situação da população de rua do Brasil e manifestou solidariedade ao trabalho desenvolvido por Lancellotti.

Padre Júlio informou que o Papa questionou a convivência com essa população e as dificuldades enfrentadas no acolhimento. A ligação ocorreu após o sumo pontífice receber fotos enviadas pela Arquidiocese de São Paulo. As imagens mostravam a realidade dos moradores de rua quando de atendimentos realizados durante a pandemia da Covid-19.

O Papa disse que sabe das dificuldades encontradas para o acolhimento aos moradores de rua em São Paulo e pediu que os responsáveis não desanimem e façam sempre como Jesus fazia, estando sempre junto dos mais pobres. Pediu também que o padre Júlio transmita em seu nome o amor e proximidade que tem em relação aos moradores de rua, orando sempre por eles.

Jorge Araujo/Fotos Publicas