O isolamento dos isolados

por Vera Bifulco

03.04.2020

Imagem de congerdesign por Pixabay

Explicar com paciência, várias vezes se for preciso, que esta situação é diferente, pode parecer estranha, mas é necessária e vai passar.

Envelhecer não se improvisa

Adoecer não se improvisa

Morrer não se improvisa

Um dos assuntos mais emergentes e urgentes nesses últimos dias é com relação aos idosos, particularmente os idosos mais vulneráveis, aqueles com mais comorbidades, os mais sozinhos, seja em domicílio ou em ILPs (Instituições de Longa Permanência, uma maneira de colocar verniz num conceito mais ou menos antigo, chamado Asilo).

Por conta da pandemia, esse isolamento que já era significativo se agravou.

As visitas dos parentes e/ou amigos, vizinhos, se tornaram mais escassas ou mesmo proibidas.

Nas ILPs estão restringindo os familiares de visitarem seus velhos ou limitam essas visitas com intervalos longos para retorno.

Vamos fazer uma distinção para o melhor entendimento da situação.

Existem três faixas etárias para se classificar os velhos.

O jovem velho, entre 60 e 70 anos, o médio velho, entre 71 e 80 anos, e o velho velho, com mais de 80 anos.

Independentemente da faixa etária e gênero, os velhos se distinguem pela maneira como envelheceram. Dessa forma, generalizar o envelhecimento é um erro, há jovens velhos e velhos jovens em dinamismo, espiritualidade, saúde e abertura para a vida. Gosto de uma frase que diz: “Velho é o jovem que deu certo!” Concordo.

O envelhecimento, por ser um processo, não é igual para todos.

Envelhecemos tal qual vivemos e aí está a diferença, não dá para voltar no tempo, não dá para se arrepender.

Mas voltemos ao nosso velho fragilizado e isolado. Como dar a atenção devida e mais, os cuidados necessários, dignos, por sinal, para que não morram de isolamento, antes mesmo de morrer de alguma piedosa doença que abreviar seus sofrimentos.

Sou daquelas pessoas que acreditam que, em tempos de crise, a palavra de ordem é criar. Minha mãe, uma bonita italiana nascida em Rimini, costumava sempre dizer: “La necessità aguzza l’ingegno”, ou seja, a necessidade aguça a criar.

Vejo, destarte, que algumas atitudes podem amenizar esse cenário:

  1. Dar mais valor ao TEMPO DO CUIDADO. Se não posso ir tantas vezes, telefono mais vezes, ligações mais longas, que demonstrem interesse em criar assuntos novos, rememorar fatos agradáveis do passado, fazer planos para curto, médio e longo prazo, onde, lógico, esse velho esteja incluído.

  2. Ter o cuidado de ver se a casa está abastecida com as prioridades mais necessárias, mas também se lembrar de abastecer o coração com alguma surpresa inusitada, um doce, um prato favorito, um suco ou mesmo um vinho, um licor, uma revista, um filme, um livro, sei lá, mas para isso é preciso que você conheça mais a história pregressa desse idoso; será que você conhece?

  3. Deixar o telefone ao alcance da mão, com números grandes, caso seja preciso uma urgência telefônica ou mesmo para dar a entender que ele pode ligar sempre que desejar.

  4. Verificar se o ambiente doméstico ou institucional está adequado e seguro dentro das normas vigentes para essa situação de contágio.

Não vou fazer esse texto longo demais, acredito já ter levantado a questão para a necessária reflexão e sua urgência.

Cada caso é único, ímpar, cada cenário onde esse velho está inserido é único também.

Explicar com paciência, várias vezes se for preciso, que esta situação é diferente, pode parecer estranha, mas é necessária e vai passar.

Temos de entender que, apesar da distância e dos afastamentos necessários, podemos sentir segurança nos entes que amamos e com os quais construímos uma história de vida.


Revisão: Maitê Ribeiro